A
revista Época, no dia 8 de
dezembro de 2015, publicou uma entrevista com Brasílio Sallum Júnior, professor
da Universidade de São Paulo (USP), e autor
do livro O impeachment de
Fernando Collor, da editora 34. Sallum expõe sua visão sobre os dois
episódios de impeachment, Dilma e Collor, e aponta três diferenças importantes entre os casos.
- A postura do
Supremo: no STF à altura da aceitação do pedido de impeachment de Collor, deu autonomia ao então presidente da
Câmara, Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), para formular as regras da tramitação. A
lei que tratava do afastamento do presidente era de 1950, e havia a
discussão sobre a adaptação dela sob a Constituição de 1988. "O STF
sempre abriu a possibilidade de os prejudicados recorrerem, mas deu liberdade
para que o Ibsen definisse o rito", diz Sallum. Em 2015, o Tribunal
não deu liberdade a Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A pedido do governo, o STF
barrou o rito que o deputado planejava para o impeachment de Dilma. Em outubro, os ministros Rosa Weber e
Teori Zavascki definiram que os procedimentos deveriam seguir a Lei
1.079/1950, a Lei do Impeachment,
em vez dos trâmites que o peemedebista citou na Câmara em setembro;
- As manifestações
populares: em 2015, parte da população foi às ruas pedir a saída de Dilma
Rousseff antes que partidos se mobilizassem pelo afastamento da
petista: 15 de março, 12 de abril, 16 de agosto. Em 1992, o
povo só aderiu ao pedido de impeachment
de Fernando Collor depois que a oposição começou a manifestar a intenção
publicamente. "Não só veio depois como foi relativamente controlada.
Naquele momento o PT, o Partido da Social Democracia
Brasileira (PSDB) e o Partido do
Movimento Democrático (PMDB) estavam juntos. Eram manifestações
mobilizadas por grupos de esquerda. Claro que tinha a classe média nas
ruas, mas a mobilização foi supervisionada. As de 2013 e 2015 não têm o
sistema político oficial como fonte. Essas mobilizações têm poder de
afetar os políticos porque eles querem se reeleger e se sintonizam com o
que a população quer." Afirma Sallum;
- Apoio de
parlamentares (e velocidade): o impeachment
de Collor tramitou com agilidade em 1992. "O pedido foi entregue no
começo de setembro, a comissão na Câmara foi formada muito rapidamente, e
no fim do mês ele já foi votado na Câmara para ser julgado no Senado. Foi
tudo muito rápido", diz Sallum. Aconteceu assim porque os
parlamentares se uniram. A destituição de Dilma não foi tão rápida. Uma
semana depois do acolhimento do pedido feito por Hélio Bicudo, Miguel
Reale Júnior e Janaina Paschoal, nem a comissão especial da Câmara para a
análise do caso havia sido formada.
Existem pontos que não foram levantados por
Sallum, porém é interessante expô-los a fim de contextualizar melhor essas
diferenças de panorama. Comparando-se os processos de impeachment de Collor e Dilma, tem-se que as situações políticas
são similares: ambos passavam por uma forte crise econômica, contextualizada
com uma grande insatisfação popular e uma notável fragilidade da base do
governo no parlamento em seu mandato.
- Segundo a pesquisa do instituto Datafolha (2015), 71% dos brasileiros consideram o governo Dilma ruim ou péssimo. Collor era rejeitado com 68% da população quando o impeachment começou a tramitar na Câmara em 1 de setembro de 1992;
- Situação
econômica do país no Governo Collor: o Brasil começou a década de 1990
ainda sem ter superado as inúmeras crises da década anterior, quando
alcançamos níveis estratosféricos de inflação, mesmo em meio à estagnação
econômica, além de problemas enormes com a dívida externa. Todos os planos econômicos criados, Plano Collor e o Plano Collor II, que tinham como finalidade parar a inflação e trazer
estabilidade à moeda, todos fracassaram. Collor resolveu então arriscar
para atacar a questão inflacionária. Para isso, tomou uma decisão que
selou seu destino: confiscou a poupança de praticamente toda a população.
Esse ato revelou-se completamente ineficaz, visto que a inflação continuou
a subir da mesma maneira – com a diferença de que o povo não tinha acesso
as suas economias. No Governo Dilma: Muitas medidas foram duramente
criticadas – como manter taxas de juros artificialmente baixas, a redução
das tarifas de energia, a política de desoneração das indústrias – todas
as medidas que pressionaram as contas públicas, levando à necessidade de
criar um ajuste fiscal e retirando a confiança dos investidores e
consumidores no país;
- Apoio no Governo
Collor: o ex-presidente governou com pouco apoio no Congresso. No início,
tinha aliados dentro de partidos importantes, como Partido da Frente
Liberal (PFL), Partido Democrático Social. (PDS), Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB) e Partido
Liberal (PL). Mas quando a ideia de seu impeachment surgiu, em meio à comoção popular causada pela
revelação de fatos comprometedores, poucos parlamentares se opuseram: as
únicas lideranças expressivas que ficaram ao seu lado foram Leonel Brizola
(PDT-RS) e Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA). No Governo Dilma: a ex-presidente
contava com uma ampla base aliada no Congresso, que incluíam mais de 300
deputados na Câmara. Seu partido ainda possui a segunda maior bancada do
Congresso, a primeira é do PMDB, por outro lado esse apoio diminuiu com o
rompimento da aliança entre PMDB e PT. O fato é que Dilma tinha uma margem
maior do que Collor nesse sentido: o governo tinha na época a
possibilidade de negociar com partidos como Partido Social Democrático (PSD)
e Partido da República (PR), que juntos somavam mais de 100 deputados;
- A sociedade no Governo Collor: a sociedade civil organizada, movimentos sociais, movimentos estudantis, sindicatos e entidades de classe, viraram as costas para o ex-presidente nos momentos decisivos durante o processo. Os grandes protestos contra o ex-presidente realizados em 1992 foram organizados pela UNE. Já o Governo Dilma: teve um respaldo maior dos movimentos sociais. A UNE e outras entidades importantes, como a Central Única de Trabalhadores (CUT) se articularam para defender o governo de Dilma nas ruas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário