terça-feira, 30 de maio de 2017


A revista Época, no dia 8 de dezembro de 2015, publicou uma entrevista com Brasílio Sallum Júnior, professor da Universidade de São Paulo (USP), e autor do livro O impeachment de Fernando Collor, da editora 34. Sallum expõe sua visão sobre os dois episódios de impeachment, Dilma e Collor, e aponta três diferenças importantes entre os casos. 

  • A postura do Supremo: no STF à altura da aceitação do pedido de impeachment de Collor, deu autonomia ao então presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), para formular as regras da tramitação. A lei que tratava do afastamento do presidente era de 1950, e havia a discussão sobre a adaptação dela sob a Constituição de 1988. "O STF sempre abriu a possibilidade de os prejudicados recorrerem, mas deu liberdade para que o Ibsen definisse o rito", diz Sallum. Em 2015, o Tribunal não deu liberdade a Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A pedido do governo, o STF barrou o rito que o deputado planejava para o impeachment de Dilma. Em outubro, os ministros Rosa Weber e Teori Zavascki definiram que os procedimentos deveriam seguir a Lei 1.079/1950, a Lei do Impeachment, em vez dos trâmites que o peemedebista citou na Câmara em setembro;

  • As manifestações populares: em 2015, parte da população foi às ruas pedir a saída de Dilma Rousseff antes que partidos se mobilizassem pelo afastamento da petista: 15 de março, 12 de abril, 16 de agosto. Em 1992, o povo só aderiu ao pedido de impeachment de Fernando Collor depois que a oposição começou a manifestar a intenção publicamente. "Não só veio depois como foi relativamente controlada. Naquele momento o PT, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e o Partido do Movimento Democrático (PMDB) estavam juntos. Eram manifestações mobilizadas por grupos de esquerda. Claro que tinha a classe média nas ruas, mas a mobilização foi supervisionada. As de 2013 e 2015 não têm o sistema político oficial como fonte. Essas mobilizações têm poder de afetar os políticos porque eles querem se reeleger e se sintonizam com o que a população quer." Afirma Sallum;

  • Apoio de parlamentares (e velocidade): o impeachment de Collor tramitou com agilidade em 1992. "O pedido foi entregue no começo de setembro, a comissão na Câmara foi formada muito rapidamente, e no fim do mês ele já foi votado na Câmara para ser julgado no Senado. Foi tudo muito rápido", diz Sallum. Aconteceu assim porque os parlamentares se uniram. A destituição de Dilma não foi tão rápida. Uma semana depois do acolhimento do pedido feito por Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaina Paschoal, nem a comissão especial da Câmara para a análise do caso havia sido formada.

Existem pontos que não foram levantados por Sallum, porém é interessante expô-los a fim de contextualizar melhor essas diferenças de panorama. Comparando-se os processos de impeachment de Collor e Dilma, tem-se que as situações políticas são similares: ambos passavam por uma forte crise econômica, contextualizada com uma grande insatisfação popular e uma notável fragilidade da base do governo no parlamento em seu mandato.

  • Segundo a pesquisa do instituto Datafolha (2015), 71% dos brasileiros consideram o governo Dilma ruim ou péssimo. Collor era rejeitado com 68% da população quando o impeachment começou a tramitar na Câmara em 1 de setembro de 1992;

  • Situação econômica do país no Governo Collor: o Brasil começou a década de 1990 ainda sem ter superado as inúmeras crises da década anterior, quando alcançamos níveis estratosféricos de inflação, mesmo em meio à estagnação econômica, além de problemas enormes com a dívida externa. Todos os planos econômicos criados, Plano Collor e o Plano Collor II, que tinham como finalidade parar a inflação e trazer estabilidade à moeda, todos fracassaram. Collor resolveu então arriscar para atacar a questão inflacionária. Para isso, tomou uma decisão que selou seu destino: confiscou a poupança de praticamente toda a população. Esse ato revelou-se completamente ineficaz, visto que a inflação continuou a subir da mesma maneira – com a diferença de que o povo não tinha acesso as suas economias. No Governo Dilma: Muitas medidas foram duramente criticadas – como manter taxas de juros artificialmente baixas, a redução das tarifas de energia, a política de desoneração das indústrias – todas as medidas que pressionaram as contas públicas, levando à necessidade de criar um ajuste fiscal e retirando a confiança dos investidores e consumidores no país;

  • Apoio no Governo Collor: o ex-presidente governou com pouco apoio no Congresso. No início, tinha aliados dentro de partidos importantes, como Partido da Frente Liberal (PFL), Partido Democrático Social. (PDS), Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e Partido Liberal (PL). Mas quando a ideia de seu impeachment surgiu, em meio à comoção popular causada pela revelação de fatos comprometedores, poucos parlamentares se opuseram: as únicas lideranças expressivas que ficaram ao seu lado foram Leonel Brizola (PDT-RS) e Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA). No Governo Dilma: a ex-presidente contava com uma ampla base aliada no Congresso, que incluíam mais de 300 deputados na Câmara. Seu partido ainda possui a segunda maior bancada do Congresso, a primeira é do PMDB, por outro lado esse apoio diminuiu com o rompimento da aliança entre PMDB e PT. O fato é que Dilma tinha uma margem maior do que Collor nesse sentido: o governo tinha na época a possibilidade de negociar com partidos como Partido Social Democrático (PSD) e Partido da República (PR), que juntos somavam mais de 100 deputados;

  • A sociedade no Governo Collor: a sociedade civil organizada, movimentos sociais, movimentos estudantis, sindicatos e entidades de classe, viraram as costas para o ex-presidente nos momentos decisivos durante o processo. Os grandes protestos contra o ex-presidente realizados em 1992 foram organizados pela UNE. Já o Governo Dilma: teve um respaldo maior dos movimentos sociais. A UNE e outras entidades importantes, como a Central Única de Trabalhadores (CUT) se articularam para defender o governo de Dilma nas ruas.

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